Ìgbà: Exercício de contemplação
Por Wagner Ferraz
Suspender o tempo, talvez seja esse o modo que eu consiga tratar da sensação que me constituiu nos instantes que me coloquei a assistir “Ìgbà: exercício de contemplação”, espetáculo de dança contemporânea do Coletivo Moebius, coreografado e dirigido de Douglas Jung. Em um texto (FERRAZ, 20014a) anterior eu havia destacado que pensar “com” (FERRAZ, 2014b) esse espetáculo me colocava no movimento de pensar a potência da simplicidade, que naquele momento chamei de “complexidade sutil do fazer simples”, um paradoxo, onde simples e complexo estão no mesmo plano. Reforço, para evitar desentendimentos, que quando falo de simples, falo de forças, de potência, de algo que pulsa, reverbera e produz movimento de forma sutil, o simples aqui se destaca mais do que os discursos que comumente circulam dizendo que um espetáculo é forte. Ao assistir esse trabalho pela segunda vez, além do simples, destaco a duração, algo que é mais próximo de proposta do espetáculo que trata da “relação da natureza com o tempo”, conforme sinopse. O convite para se colocar em “exercício de contemplação” instaura a possibilidade de se dar tempo, durar, viver os instantes. |
“Com” Ìgbà consigo pensar um tempo suspenso. Quero dizer que Ìgbà não me instrumentaliza para mensurar o tempo, para classificá-lo, para descrevê-lo, mas me oferece condições para experimentar a duração. Para ser atravessado pelo tempo de diferentes formas, e não deslizar no tempo cronologicamente, mas deslizar pelas linhas infinitas dos figurinos que se contorciam no chão junto com corpo das intérpretes.
O que fazer da vida quando o tempo não escorre representativamente pelas mãos, mas nos compõe impossibilitando referências que nos dizem que a segurança está em contar cronologicamente o que passou, o que está acontecendo e o que está por vir? Digo que exercitar contemplar a vida pode vir como uma resposta para essa questão. Essa é uma grande sacada do espetáculo, propor um exercício de contemplação.
Ìgbà me proporcionou condições para a contemplação, e isso me fez sentir como folha ao vento, sem tempo definido para deslizar no ar, sem local exato para cair, sem graus definidos para girar, sem km de percurso definidos para percorrer, apenas me senti suspenso, leve no vento e ao mesmo tempo pesado com a força da gravidade. Assim como contemplava, também, me sentia deslizando em círculos infinitos.
Parabéns Douglas Jung, Coletivos Moebius, Lucida Desenvolvimento Cultural/Luka Ibarra e tod@s envolvidos.
Esse espetáculo foi assistido no dia 21/11/2015, às 18 horas, no Teatro do Centro Histórico-Cultural Santa Casa, na cidade de Porto Alegre/RS.
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DIREÇÃO GERAL E COREOGRAFIA: Douglas Jung
INTÉRPRETES: Alyne Rehm, Bianca Brochier, Débora Nunes, Ferhi Mahmood, Luiza Fischer, Priya Mariana Konrad, Raquel Vidal e Renata Stein
TRILHA SONORA ORIGINAL: Guilherme Guinalli
CENOGRAFIA: Douglas Jung
FIGURINO: Anderson Luiz de Souza e Marcela Correa de Correa
ILUMINAÇÃO: Guto Greca
COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO: Coletivo Moebius e Lucida Desenvolvimento Cultural / Luka Ibarra
EQUIPE DE PRODUÇÃO: Ana Paula Reis, Débora Nunes, Natália Utz, Taiane Panizzi, Driko Oliveira e Bodh Sahaj
FOTOGRAFIA: Bianca Brochier e Bodh Sahaj
DESIGN GRÁFICO: Bianca Brochier
Referências:
DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. Tradução: Luiz B. L. Orlandi. São Paulo: Editora 34, 2012.
FERRAZ, Wagner. “Ìgbà: uma complexidade sutil do fazer simples”. Publicado em 24/06/2015b, Porto Alegre/RS. Disponível em: http://dancedancebr.weebly.com/textos/igba-uma-complexidade-sutil-do-fazer-simples.
FERRAZ, Wagner. Pesquisar e pensar “com”: Entre criação artística e criação acadêmica. In.: FERRAZ, Wagner (Org). Experimentações Performáticas. Porto Alegre: INDEPIn, 2014b. (Coleção Estudos do Corpo, v. 2). Disponível em: https://pt.scribd.com/doc/275770813/Pesquisar-e-Pensar-com-Entre-Criacao-Artistica-e-Criacao-Academica-Texto-Wagner-Ferraz. Acesso: 31/10/2015.
FERRAZ, Wagner. Corpo a Dançar: Entre educação e criação de corpos. Porto Alegre, 2014. 190f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014c. Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/106500. Acesso: 31/10/2015.
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Wagner Ferraz é um dançante, professor, pesquisador, performer e gestor cultural. Coordenador dos Estudos do Corpo, Editor da Revista Informe C3 e Coordenador Editorial da CANTO - Cultura e Arte. Já organizou e escreveu alguns livros que podem ser encontrados em http://canto.art.br/canto-editorial/. Atua como professor em cursos de Pós-Graduação lato sensu na área da Educação na UFRGS e CAPACITAR e professor do Curso de Graducação Tecnológica em Dança da Universidade de Caxias do Sul. Contato:[email protected]. Site: www.processoc3.com.